Rebelo sinaliza possíveis alterações em seu substitutivo

Moratória de cinco anos para novos desmatamentos e APPs correm risco. Relator diz que propostas deverão ser negociadas. Ruralistas endurecem discurso.

Oswaldo Braga, ISA

O deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) sinalizou ontem quais podem ser as modificações que fará em seu projeto sobre o Código Florestal. Ele avalia retirar de seu texto a moratória de cinco anos para novos desmatamentos, diminuir pela metade todas as faixas de Áreas de Preservação Permanente (APP) para a agricultura familiar e ampliar mecanismos de anistia para quem desmatou ilegalmente.

Rebelo afirmou ontem ter “simpatia” por essas propostas. Disse o mesmo sobre o documento articulado no fórum Diálogo Florestal por empresas do setor florestal e organizações ambientalistas, entre elas o ISA, que foi divulgado oficialmente hoje em São Paulo. Ele não soube responder quais pontos desse documento cogita discutir. O texto de empresas e ONGs rejeita a diminuição das APPs e ocupações nessas áreas.

O deputado deixou claro, no entanto, que aceitar qualquer proposta depende de negociação. “O relatório não é do relator. Ele depende da correlação de forças”, afirmou.

O parlamentar disse acreditar que ainda está valendo o acordo feito entre o presidente da Câmara, Marco Maia, e o colégio de líderes para incluir seu projeto na pauta de votação do plenário ainda em março. O próprio Maia criou há três semanas uma “câmara de negociação” para tentar construir consensos sobre o assunto.

O colegiado caminha a passos lentos. Teve apenas uma reunião, na terça-feira. A única decisão tomada foi abrir o prazo até o próximo dia 29 para a entrega de notas técnicas dos parlamentares ou de instituições interessadas.

Dentro e fora da “câmara de negociação”, a bancada ruralista pressiona pela votação imediata do projeto. “Entendemos que até o dia 5 de abril estaremos dispostos ao diálogo. Depois disso, as dúvidas que ficarem devem ir ao plenário. A câmara de negociação é apenas consultiva”, avisou o deputado Valdir Colato (PMDB-SC) em uma audiência pública na Câmara dos Deputados. No dia 5, está prevista em Brasília uma manifestação organizada pelos ruralistas em defesa do substitutivo.

Anistia
O atual texto de Rebelo prevê vários tipos de anistia para quem desmatou irregularmente. Todas as APPs (beiras de rio, encostas, topos de morro etc.) desmatadas na zona rural até julho de 2008 poderiam ser consideradas pelos órgãos ambientais estaduais como “consolidadas” e, assim, não precisariam ser recompostas, como determina a lei atual. Para áreas de até quatro módulos fiscais, quem desmatou sua Reserva Legal (RL) também não precisaria recuperá-la.

Apesar de já ter proposto todas essas possibilidades, Rebelo afirmou que “a anistia seria mais um ponto que pode ser discutido”, sugerindo que poderia ampliá-la. Na mesma audiência, citando casos históricos sem relação com o assunto, como o perdão concedido aos combatentes da Guerra dos Farrapos (RS), ele disse que o “Brasil tem tradição em anistias”.

Representantes de ambientalistas na audiência na Câmara insistiram na necessidade de buscar consensos e discutir as alterações no Código Florestal sem pressa.


No prazo de cinco anos, que Rebelo denomina de “moratória”, segundo seu relatório, não seriam autorizados novos desmatamentos, mas, em compensação, não poderiam ser aplicadas ou cobradas novas multas. Ou seja, atividades produtivas realizadas em áreas desmatadas ilegalmente continuariam permitidas. O deputado afirmou que recebeu inúmeros pedidos de governadores e secretários de estados como Piauí, Bahia, Tocantins e Acre para que retirasse de seu texto a moratória sob a justificativa que ela atravancaria a produção agropecuária.

APP
Em seu projeto, o deputado também incluiu a diminuição, de 30 para 15 metros, das APPs de cada lado dos rios de até cinco metros. Os cursos de água dessa largura correspondem a mais de 70% da malha hidrográfica.

Segundo o Código Florestal, a APP varia hoje de 30 a 500 metros, dependendo da largura do curso de água. Mas Rebelo avalia a sugestão da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) de reduzir todas as faixas de APP para um intervalo entre 7,5 metros e 250 metros em propriedades de agricultores familiares. O texto atual de seu relatório determina que a medição da APP seja feita a partir da vazão mínima do rio, na época de seca (hoje a medição é feita a partir da vazão máxima, na cheia). Na prática, isso já diminui as faixas de APPs vigentes.

O coordenador adjunto do Programa de Política e Direito Socioambiental (PPDS) do ISA, Raul do Valle, condenou, durante a audiência na Câmara, a criminalização dos produtores rurais. “A fiscalização abusiva existe e é um equívoco. Ninguém quer ver os produtores rurais multados, impedidos de produzir. Queremos que eles tenham condições de conservar ou recuperar as áreas ambientalmente importantes”, afirmou.

Ele criticou, no entanto, a redução das APPs prevista no relatório de Rebelo. “Não há um problema generalizado de produção agropecuária sobre APPs no Brasil”, disse. Valle trouxe dados de alguns dos principais municípios produtores de uva e arroz para mostrar que uma parte insignificante dos cultivos está localizada sobre essas áreas, ao contrário do que afirmam os ruralistas.

Valle alertou para a incoerência da regra prevista no relatório Rebelo que permite aos órgãos ambientais definir quem poderá ou não ser anistiado por desmatamentos ilegais. “Os mesmos órgãos e fiscais que hoje, segundo os senhores, praticam abusos, serão os que irão avaliar quem deve ou não recuperar as áreas desmatadas. A regra será o “caso-a-caso” e não tenho dúvida de que isso abrirá espaço para corrupção ou abuso de autoridade. Temo que o critério deixe de ser a importância do rio e passe a ser a importância do proprietário.”

O representante do ISA enfatizou que as organizações ambientalistas querem votar as mudanças no Código e é possível chegar a pontos de consenso. Ele mencionou o cômputo das APPs na área de RL e o uso agrícola das APPs de topo de morros, com restrições, como alguns desses pontos. Mas afirmou que as alterações na lei não podem significar diminuição na proteção a áreas ambientalmente importantes.

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